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  • Atena Beauvoir Roveda

A MILITÂNCIA, O POVO E O DESAFIO DA FORMAÇÃO POLÍTICA

Atualizado: 9 de abr. de 2021

Intuitivamente diferencio curso de formação política para formação política em si, ao pensarmos esse curso enquanto já um termo refletindo um espaço conteudista e muitas vezes com pouco tempo para o que é formação política de fato; pois que entendo ser a existência do sujeito e da sujeita, o núcleo primeiro de qualquer forma política organizada entre inteligência, sentimento e ideal, tratando nesses cursos, muito mais letramento teórico e leitura do o que de fato cada um carrega em seu ser político social.


Um militante que somente expresse em si teorias e bases de conteúdo sobre estratégia política e eleitorais ou visões de macroeconomia aplicada ao campo nacional e internacional, caso não reúna em si uma presença de sentimento que lhe impulsione aos outros, será infrutífera e carente de socializar tais conhecimentos, inclusive na base da comunicação a que se estrutura sempre na relação de afeto - do afetar-se e afetar. Ou se somente detiver suas construções sentimentais em uma luta baseada nos impulsos desse sentimento e de emoções ilimitadas, mas carente de organização, método e base teórica, agirá tal qual o ditado popular: fogo de palha. Aquele que fixar-se no ideal, mas sem qualificar-se no estudo e pesquisa e na elaboração de sentimentos baseados na cooperação, solidariedade e comunicação afetiva, não saberá avaliar o que de fato já foi alcançado na sua luta política, perdendo-se a mais das vezes em labirinto de soluções estrangeiras para causas nascentes no seu torrão brasileiro.


No meu campo político, o Trabalhismo Brasileiro, tenho exercido intensa movimentação de ofertar Formações Políticas, primeiro para mim mesma e conseguinte para os que desejam somarem-se no processo, a respeito de diversos temas, principalmente dos que estão nos fundamentos da tese trabalhista. Porém, tenho advertido a quantas e quantos já estiveram conosco nos encontros virtuais, de que o primeiro processo reflexivo em uma Formação Política deve ser de sua relação com o seu atual Partido Político e o que, não os que estão em executivas, mas o que as teses da doutrina partidária lhe evocam reconhecerem-se na luta daquele espaço político.


O que mais tenho percebido em minhas avaliações após esses encontros é a ausência de uma incorporação dessas teses, de maneira que o estudo não seja uma verborragia teórica para solucionar problemas brasileiros. Pensam em comer os frutos, sem questionarem onde estão as sementes a serem plantadas.


A leitora e leitor me perdoem a insistência de citar como exemplo o Trabalhismo Brasileiro, mas faz-se necessário, pois é nessas águas que navego. Alberto Pasqualini é considerado historicamente o organizador das teses trabalhistas. Foi Senador do Rio Grande do Sul pelo antigo PTB, o histórico, e inclusive citado pelo presidente Getúlio Vargas como o “doutrinador mais autorizado do trabalhismo brasileiro”. Mas ao fim de todas as nossas formações políticas aplicamos um questionário de “Análise Crítica” para uma avaliação da forma, conteúdo e dinâmica dos encontros virtuais.


Em determinado momento perguntamos se, caso fosse filiada ou filiado ao PDT, já havia lido a obra de Alberto Pasqualini. E 70% afirmaram jamais terem lido o doutrinador mais autorizado do trabalhismo brasileiro. 55 pessoas participaram da Análise Crítica, de 14 estados brasileiros, de todas as regiões do país. Fica explícito quão importante é a construção de uma Formação Política que tenha vínculo com aqueles três fundamentos centrais da militância: inteligência, sentimento e ideal.


Mas repare que estamos dialogando sobre militantes, pessoas envolvidas com debates sobre política nacional, jogo eleitoral e afins. Até que um rapaz questiona, em um dos encontros, “como explicar o trabalhismo brasileiro para as pessoas lá fora? Tem gente que não vai querer saber isso tudo de conteúdo!”. Eu concordei e afirmei que o conteúdo dessa tese trabalhista é para a militância estudar, ela deve ser a referência em si desse estudo. E complementei com uma provocação, porque não existe Formação Política, entendida enquanto Educação Política, sem desacomodar quem se forma politicamente. Questionei “Qual seu estado e cidade?” e ele respondeu. Outra questão: “E quantos bairros tem na sua cidade?”. Ele disse que não sabia, eram muitos, mas que não sabia. E nisso eu propus a ele a reflexão de que era mais grave ele não saber quantos bairros existiam na sua cidade, tendo todo o fôlego de estar na vida política partidária, do que a população não compreender o conceito de “usura social” no trabalhismo brasileiro. E é disso que temos dialogado frequentemente. Um partido político que se diga popular e seus militantes desconhecem onde esses sujeitos e sujeitas populares vivem, é um ponto a ser superado no atual cenário político brasileiro.


Não existe uma resposta teórica fundamentada, em autores brasileiros ou não, a respeito da participação popular nos partidos políticos. Há, sim, uma resposta existencial. As militâncias representam a ideologia partidária, que segundo Pasqualini, é a alma dos partidos políticos.


Não há como conceber vínculos populares sem sequer conhecer a estrutura da sua cidade, bairros, vilas, becos e favelas. Nessa composição desafiadora, a inteligência, o sentimento e o ideal devem estar em uníssono equilíbrio, para que o peso da balança não se altere e a qualidade do conteúdo doutrinário de um Partido Político não seja modificada pela forma com que a militância se relaciona com o povo, ou com a forma com que a militância não se relaciona com o povo. Em um partido popular, a sua tese partidária deve ser vivenciada com e pelo o povo, caso contrário o adjetivo popular estará somente no texto.


Mas se é correto usar o termo “Curso” ou não, isso é irrelevante. Sinceramente. Mas provoquei a reflexão no início do texto, pois não teria sentido eu escrever para somente as vontades acomodarem-se nas poltronas e continuarem na bolha do passarinho azul. Afirmo que se há um curso é o das águas, a que uma formação política viva de existência histórica e sentido popular fará passarmos por grandes tempestades no oceano da vida brasileira e latino-americana, mas igualmente tempos de alguma bonança, sendo necessário jamais descuidar do que se move nas profundezas desse oceano.

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