- Bryan da Fonseca Araújo
O último refúgio de Bolsonaro
Atualizado: 16 de mai. de 2021
Bryan Araújo da Fonseca
Advogado, especialista em Direito Penal, Processo Penal e Segurança pública.
Mestrando em Ciência Política (UFPB)
Jair Bolsonaro se fez na política a partir do antagonismo, era aquele deputado sempre de oposição, independente do governo de momento. Quando Fernando Henrique Cardoso era o Presidente, defendeu o fuzilamento do mesmo e alegou ter votado em Lula em 2002. Com o PT no poder, por sua vez, passou a ser um dos mais ferrenhos críticos aos governos do partido.
Sempre no papel de pedra e nunca de vidraça, Bolsonaro acostumou-se a apontar erros alheios, mas nunca apresentar soluções para o que quer que seja.
Contudo, eis que a sorte lhe sorri, levando-o a vencer as eleições Presidenciais de 2018. Jair ocuparia, pela primeira vez em sua longa carreira política, um cargo no Executivo, e aparentemente até o momento, não exerce com a mesma desenvoltura o papel de alvo, como exercia no papel de flecha.
Uma vez na presidência, Bolsonaro deveria ser aquele a quem se exige soluções, afinal ele é o comandante chefe do Executivo nacional, entretanto, insiste em não abandonar o seu papel de deputado baixo clero de oposição.
Atacar é o norte do governo, sempre buscando adversários novos e terceirizando culpas como se o detentor do poder máximo no sistema presidencialista fosse mero coadjuvante ou tivesse os mesmos poderes de um vereador de “Arraial dos cavalos”, exercendo a função de mero observador durante a maior crise sanitária e econômica da nossa história.
O filósofo argentino Ernesto Laclau um dos grandes estudiosos sobre o populismo na América Latina, descreve que o antagonismo específico, ao conseguir traduzir todos os outros conflitos sociais de forma hegemônica, torna possível o pacto populista. Trocando isso em miúdos, cria-se inimigos para canalizar os descontentamentos da população em uma simples disputa do “nós contra eles”.
Bolsonaro precisa do conflito, precisa de algozes e inimigos a quem possa culpar pelos seus fracassos e ineptidão do seu governo.
Seus alvos já foram do então presidente da câmara dos deputados federal Rodrigo Maia, ao Supremo Tribunal Federal, acusando-os de atrapalharem, de alguma maneira, a sua gestão. Atualmente, os adversários da vez são os governadores e prefeitos dos estados e suas medidas de combate ao Covid-19.
Bolsonaro critica a adoção de medidas restritivas dos governadores para conter a alta dos casos e mortes pela doença, ameaçando-os com colocar as forças armadas em campo “para proteger a constituição”. Tal ameaça for reafirmada no programa de comédia/policial de um dos seus apoiadores, o apresentador Sikêra Júnior em uma rede de televisão no Amazonas.
Essa ofensiva de Bolsonaro não é à toa, como nada deste governo o é. Afinal, a fala da peça “Hamlet” de Shakespeare tem sido o mantra para descrever este governo: “Isso é loucura, mas essa loucura tem método”.
Ao atacar as medidas de restrição dos governadores, o Presidente busca encontrar um bode expiatório para o debacle econômico, causado pela total ausência de ações do governo federal.
O país poderia e deveria ter agido de forma direta para o socorro dos trabalhadores e empresários, como ocorreu em outras partes do mundo. A exemplo, em março de 2020, no início da crise do Covid-19, o governo britânico anunciou um pacote de R$ 122 bilhões de reais (£ 20 bilhões), que foram injetados diretamente nas pequenas e médias empresas a partir da suspensão de impostos e pagamentos de aluguéis, salários dos funcionários, dentre outras despesas, mais R$ 2 trilhões de reais em empréstimos, muitos deles a juros zeros.
Os EUA por sua vez, aprovou a época um socorro de 2 trilhões de dólares as empresas e trabalhadores.
No Brasil pouco ou nada foi feito para o socorro dos micro e pequenos empresários sob o pretexto de não se poder fazer. Sendo a única solução a manutenção da abertura do comércio mesmo o país atingindo quase 5 mil mortos por dia.
Com 2,7% da população mundial, o Brasil representa hoje 3,8% de todas as vacinas aplicadas, sendo responsável também por 9,7% dos casos e 12,6% das mortes em todo o planeta.
O resultado não podia ser outro, enquanto países que encontravam-se em situações piores que o Brasil no início da pandemia, começam a voltar à normalidade, por aqui mantemos uma média diária de 3 mil mortos por dia, atingindo a marca dos 400 mil mortos durante toda a pandemia, e repetindo tal resultado catastrófico também na economia.
Sob o discurso “ou a vida ou a economia” acabou-se perdendo ambos.
Com o fracasso flagrante do governo, Bolsonaro volta a velha tática de terceirização da culpa, apostando que o caos o permitiria aumentar seu controle sobre as demais instituições.
O alvo de suas falas está cada vez mais claro, é dirigido a setores das forças policiais nos estados.
Recentemente, o instituto Atlas em um levantamento inédito feito sobre as forças de segurança nacional (polícia militar, civil e federal), identificou que há uma diferença considerável entre as polícias quando o assunto é o governo Bolsonaro.
Entre os policiais civis, 53% disseram ter votado em Bolsonaro no 2° turno das eleições de 2018 e, desse total, a maioria, ou 61%, diz hoje estar arrependida.
Na PF por sua vez, 61% afirmam ter optado por Bolsonaro, sendo que destes, 38% mostram-se arrependidos.

O grande apoio de Bolsonaro permanece na polícia militar, onde 71% declaram ter escolhido Bolsonaro, desse total, 81% dizem que continuam hoje contentes com a opção que fizeram.
Essa tendência se confirma na avaliação do governo Federal dentro das polícias, onde o governo é considerado ruim ou péssimo para 62% dos civis, 49% dos federais e 35% dos PMs.


Desta forma, sabendo da sua força em alas da polícia militar, Bolsonaro aposta no confronto contra os governadores, esperando uma insurreição dos policiais. Algo que já vimos de alguma forma com os motins em inúmeros estados no ano de 2020, muitos deles liderados por políticos ligados a Bolsonaro.
Recentemente dois casos chamaram a atenção, o 1°, de um policial militar na Bahia em março deste ano, que em surto, foi morto por agentes do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) após atirar contra a polícia. O soldado Wesley Soares logo foi usado por políticos bolsonaristas como exemplo da revolta contra os governadores.
Um mês depois, um outro PM foi preso após fazer uma funcionária da GOL refém no Aeroporto de Guarulhos. Frederico Correia Resende pedia constantemente para falar com agentes da PF e proferia frases desconexas de cunho político.
A utilização de policiais militares como “bucha de canhão” para levantes autoritários pelo governo Federal é algo a ser analisado com o devido cuidado e atenção, uma vez que o presidente vem afirmando de maneira constante, o seu desapego a valores democráticos e seu inconformismo com um possível resultado adverso nas urnas nas eleições do ano que vem. Bolsonaro já percebeu que esta instrumentalização da polícia militar pode ser o seu último refúgio para sua sustentação no poder.