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  • Felipe Rabelo Soares

O impeachment e a imprensa: 2016, o ano que não acabou

Atualizado: 24 de jul. de 2021


 

Por Felipe Rabelo Soares

Graduado em História

 

No período civil militar Brasileiro (1964 a 1984) os debates ocorriam de maneira mais tímida devido à repressão e tinha certo engajamento contra a política e as condições impostas pelo sistema ditatorial do momento. Em contrapartida, as discussões eram muito bem definidas, claro com antagonismos, porém, com bastante autoridade mútua para discorre sobre os assuntos de interesse social. Bastante diferente do que presenciamos atualmente. Basta olharmos as rodas de conversas, onde os achismos e as adjetivações tornaram-se pré-condição essencial para o desenrolar de um debate. Convenhamos, nesse sentido a grande imprensa (Folha de São Paulo, Globo, Estadão de São Paulo) tem colaboração direta nesse processo e com muito embasamento e qualidade.


O estudo The Agenda Setting Function of Mass Media realizado desde os anos 40, onde somente em 1972 foi publicado pelos pesquisadores Maxwell MCcombs e Donald Shaw, desenvolveram uma hipótese buscando explicar como que a mídia determina os assuntos que serão discutidos pela sociedade, sendo chamada de Agenda Setting. A pesquisa comprovou que os assuntos debatidos entre os consumidores de informação eram os mesmos que os sugeridos pela mídia, ou seja, a opinião pública seria provocada pelos veículos de comunicação, influenciando diretamente a opinião dos receptores.


A Grande imprensa Brasileira no período Civil Militar Brasileiro utilizou - talvez naquele momento não sabia que praticava esse modelo – e a atual ainda utiliza a agenda setting, pois contribui na propagação da informação de maneira obscura e tendenciosa, onde os fatos são apresentados ao indivíduo no dia a dia, de maneira abstrata e superficial, colaborando sistematicamente para o crescimento do ódio e da intolerância de ideias. Basta observar os últimos anos da cobertura política Brasileira pela Grande Mídia, onde publicava tudo, sem ironia. E nesse momento que observamos uma narrativa extremamente interessante, que merece ser analisada para compreendermos melhor os fatos que resultarão nessa crise institucional no Brasil em 2016, e que pela conjuntura deveria perdurar até meados de 2018, com as reformas em pautas no Congresso e no Senado, com movimentos sociais contrários às propostas do governo Temer e a eleição presidencial. Assim, seria necessário utilizar a sugestão de Michel de Certeau em A Escrita da História, ou seja, fazer uma investigação historiográfica que precisa de um sujeito que o faça. O historiador. Onde segundo o filosofo alemão Friedrich Nietzsche na obra Segunda Consideração Intempestiva: Da utilidade e Desvantagem da História, “a partir da suprema força do presente, [tem] o direito de interpretar o passado, dando-lhe sentido”. Porém, a brevidade desta análise não nos permite aprofundar com o devido empenho que merece, ficando assim para outro momento.


No livro O golpe de 1964: Momentos Decisivos do historiador Carlos Fico, uma das abordagens aponta que as reformas de base fizeram com que João Goulart sofresse um duro golpe de estado, por entender que deveria fazer reformas que favorecia o povo Brasileiro, e principalmente aqueles de classe mais baixas. Por outro lado, existia uma classe de políticos e empresários, que com o apoio da imprensa, conseguiu derrubar o presidente João Goulart acusando-o de comunista, de ter fugido do país e de estar subvertendo a ordem econômica imposta pelos EUA no contexto da guerra fria no mundo ocidental.


Em 2014 nas eleições presidenciais do Brasil, com mais de 54 milhões votos, Dilma Rousseff e reeleita para presidir o pais por mais quatro anos. Porém, o candidato Aécio Neves (PSDB), que perdeu a eleição, não aceita a derrota de forma democrática, quando pede a recontagem dos votos. Ainda em 2014, no Congresso e nas entrevistas para os grandes veículos de comunicação, pedia o afastamento da Presidente. Começava em 2015 uma campanha ferrenha contra as políticas sociais iniciadas pelo ex-Presidente Lula e tinha continuidade com a presidente Dilma Rousseff, refletindo de forma acentuada na economia do Brasil e pontualmente nas classes mais pobres.


Ainda nessa perspectiva, o ano de 2015 a grande mídia publicava diariamente nos telejornais e jornais impressos, que o PT e a presidente Dilma Rousseff eram os grandes responsáveis pela corrupção no País, fazendo um julgamento midiático e condenando o PT e a presidente ao mesmo tempo, diante da opinião pública, colocando sobre risco todas as políticas sociais feitas nos governos petistas nos 13 anos de poder. Os efeitos da propaganda midiática contra o governo Dilma e o PT não demoraram muito a dar resultado, pois a elite Brasileira mostrou sua influência, com o apoio da nova classe média ou classe Trabalhadora, como fez em 1964.


As elites econômica e política em 1964 saíram às ruas na manifestação marcha da família com Deus pela Liberdade, contra as reformas de base derrubaram Jango. (FICO, 2015) Com Dilma Rousseff não foi diferente em 2015 e 2016. Grupos como MBL (Movimento Brasil Livre), MVP (Movimento Vem pra Rua) e outros ligados a direita, foram às ruas pedir o impeachment da Presidente Dilma Rousseff e o fim do PT, pois acreditava que o Partido dos trabalhadores fosse sinônimo de ladrões e salteadores, sem contar o bate panela nos bairros nobres das grandes capitais que apoiavam a saída da presidente. Detalhe, hegemonicamente as pessoas que frequentava as manifestações, eram de classe média. Um fator importante, a pesquisa digital realizada pelo o El País no dia 13 de março com bases coletadas no Facebook, mostrou que manifestantes a favor do impeachment consumia informações de veículos como Veja, Estado de São Paulo e Folha de São Paulo.


Nesse sentido, mais uma vez a imprensa teve o seu papel importante, fazendo uma espetacularização dos movimentos de ruas a favor da destituição, e claro, fomentando diariamente uma gíria chamada pedalada fiscal, ou seja, a teoria do agendamento sendo praticada de forma eficaz. Inevitavelmente, Dilma Rousseff foi incriminada por crime de responsabilidade, que ocasionou, no dia 31/08/2016, o seu impeachment.


A despeito do que se propagava naquela época até o momento que escrevo esse texto, não foi apresentado à população provas de participação da ex-presidente Dilma Rousseff em casos de corrupção. Porém, vale ressalta mais uma vez, Aécio Neves ajudava a propagar uma narrativa que teve um julgamento na opinião pública, satisfatório para o impeachment, através de frases como; “o governo Dilma é um fracasso”, “o PT só tem corruptos, logo Dilma não tem condições de governar”. Porém, as mazelas do Senador Aécio Neves, por exemplo, tiveram sua menção no escândalo da lava jato simplesmente silenciadas pela imprensa. Hoje o Deputado Federal Aécio Neves representa um pouco da nossa política e plutocracia Brasileira, retrógrada, fisiológica, reacionária e corrupta. E claro, com apoio de grandes instituições do campo empresarial e midiático, que em nome do “bem-estar democrático”, não mede esforços e nem escrúpulos em prol dos próprios interesses.


Em nome da “ordem democrática” os interesses sempre vêm em primeiro lugar. Haja vista a ruptura institucional, que teve um amplo apoio de uma (plutocracia) extremamente interessada no golpe, onde podemos destacar o campo empresarial, tendo como representante simbólico a FIESP (Federação das Indústrias de São Paulo) e claro, a grande mídia. Contudo, tinha o fato da mesma plutocracia não suportar a ideia de uma candidatura de Luiz Inácio lula da Silva em 2018, e que as pesquisas de opinião na época apontam para vitória na corrida presidencial. Entretanto, a grande imprensa Brasileira continua explorando a sua imagem de maneira negativa, para causar um novo desgaste até o ano da próxima eleição, ou seja, mais uma vez parte importante da imprensa não tendo a mínima preocupação com a qualidade da democracia e da agenda pública, contribuindo mais uma vez para personalização da política.


O argumento dado para a derrubada da presidente foi de que deveria haver mudanças no campo político e econômico do país e acabar com a corrupção tirando de vez o PT em função da operação lava jato, e a grande solução de todos os males passava então pelo Vice-Presidente Michel Temer, que aderiu ao movimento do Impeachment em 2015, publicando plano de governo “Ponte para o futuro” em outubro. No dia 2 de Dezembro, Eduardo Cunha Presidente da Câmara acata o pedido de impedimento, e no dia 8 de Dezembro, a carta de Michel Temer para Dilma é vazada a imprensa, onde anuncia sua ruptura com o governo.


Por outro lado, muitos políticos enxergaram na derrubada de Dilma uma maneira de acabar com a lava jato, pois as investigações da força tarefa mostraram que partidos como PT, PSDB e PMDB e outros tinha fortes indícios de participação no esquema de corrupção. Deste modo a preocupação ficou evidente em uma ligação do Senador Romero Juca em conversa com um coronel do PMDB Sérgio machado, onde Juca dizia “Tem de mudar o governo, para estancar a sangria”. Isso é só um fator que reforça a ideia do golpe, e que a grande mídia não dá muita importância. Portanto, a Operação lava jato, a cada operação, mostrava que as ditas “Pedalada fiscal” do governo petista, propriamente o de Dilma Rousseff, era apenas um delito escolar comparado aos delitos cometidos pelos correligionários do PSDB/PMDB. Mas como divulgado recentemente nas matérias do site The Intercept sobre os vazamentos dos procuradores da lava jato “Não podemos Melindrar alguém, cujo apoio é importante”. A grande imprensa sabe disso muito bem. E aí grande imprensa, teremos autocritica? 2016 ainda não acabou.

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